terça-feira, 17 de abril de 2012



Como definir a insanidade? Como dizer que o sujeito A ou B é louco, como o Coringa do Batman? Em que momentos devemos invadir a privacidade de alguém para assumir o comando da vida de alguém? Existe diálogo e respeito entre pais e filhos? Entre familiares existe carinho real? Essas são algumas das muitas e relevantes questões que Canto dos Malditos nos leva a refletir.

Por amar literatura e, principalmente quadrinhos, e presenciar as terríveis adaptações que normalmente são feitas no cinema, costumo ser contra “adequações”. Em minha visão, raras são as que funcionam adequadamente quando são transportadas para outro estilo artístico, principalmente a sétima arte. As adequações não transmitem a força da obra original e o resultado final é, normalmente, simplório e apenas um marco para ganhar dinheiro. E digo o mesmo quando a arte, em película, vai aos quadrinhos ou livros. Não funciona. Como diz o mestre Alan Moore: “Cada arte é única. Eu faço quadrinhos não cinema, apesar de gostar de sétima arte”.

Mas, como tudo na vida, as regras são feitas para serem quebradas, Canto dos Malditos, de Austregésilo Carrano Bueno (no cinema O Bicho de Sete Cabeças, com Rodrigo Santoro) é uma prova de que, às vezes, funciona. Mas, meu foco será o livro, apesar de ter amado o longa-metragem (primeiro filme que Santoro provou ser ator e não mais um rostinho na tela), e sua trilha sonora.

O livro de Carrano é uma obra vigorosa, detalhista e, ao mesmo tempo cruel. Atroz por funcionar como uma denúncia a situação dos hospitais psiquiátricos no Brasil. Impossível não se sentir incomodado, cutucado por esse livro que traça um triste quadro de abandono, tanto dos hospitais quanto de pacientes.

O autor, um ex-paciente desses hospitais psiquiátricos, relata com força e coragem, o horror de eletrochoques e das doses, cavalares de medicamento. Uma descrição feita com maestria, dor, e realidade. Dizem que alguns filmes funcionam como um soco no estômago do público. Ao apresentar a realidade disfarçada ou escondida, o que podemos dizer desse pequeno documentário histórico? Um livro que obriga o leitor a refletir, pensar e questionar tudo o que foi relatado. Mas, não pense que o livro relata o caso do autor e que o leitor não se pegará pensando em qual a relação de diálogo existente entre pais e filhos, mães e filhas. No final, percebemos que Contos Malditos é um retrato cruel e dolorido da sociedade moderna em que as conversas entre familiares, em 90% das vezes, são trocadas por bens materiais e o respeito ao próximo está cada vez mais distante.....uma pena.

Depois do livro, assista à bela atuação de Santoro e se delicie com a trilha sonora. A música de Zeca Baleiro representa exatamente as dores e a falta de diálogo real entre algumas relações familiares. Vamos escutar sentir e refletir.

Documentários recomendados: A Casa dos Mortos



 
Indicado pelo grupo de Saúde Mental na Uerj, o documentário "A casa dos mortos" relata o Manicômio Judiciário de Salvador. A antropóloga Débora Diniz, diretora do filme, ressalta o polêmico tema dos manicômios judiciários como o grande desafio da Reforma Psiquiátrica Brasileira.
O FILME: Bubu é um poeta com doze internações em manicômios judiciários. Ele desafia o sentido dos hospitais-presídios, instituições híbridas que sentenciam a loucura à prisão perpétua. O poema A Casa dos Mortos foi escrito durante as filmagens do documentário e desvelou as mortes esquecidas dos manicômios judiciários. São três histórias em três atos de morte. Jaime, Antônio e Almerindo são homens anônimos, considerados perigosos para a vida social, cujo castigo será a tragédia do suicídio, o ciclo interminável de internações, ou a sobrevivência em prisão perpétua nas casas dos mortos. Bubu é o narrador de sua própria vida, mas também de seu destino de morte.
 
"A falta de tratamento adequado, de terapias, atividades de cunho social e trabalho de incentivo à reaproximação familiar levam, inevitavelmente, à instituição não oficial de algo proibido pela Constituição". "A prisão perpétua acaba ocorrendo nesse cenário", destaca Débora.

"Na avaliação de Débora, transferir a responsabilidade do tratamento à área da saúde é uma das tentativas interessantes para mudar a realidade dos manicômios judiciários". Segundo ela: "Seria a transmissão do mundo da medicalização para o mundo social".

Filmes Recomendados: Bicho de Sete Cabeças

"Bicho de Sete Cabeças é um filme de drama brasileiro de 2001 dirigido por Laís Bodanzky e com roteiro de Luiz Bolognesi baseado no livro autobiográfico de Austregésilo Carrano Bueno, Canto dos Malditos. O filme foi realizado com a parceria entre as produtoras brasileiras Buriti Filmes, Dezenove Som e Imagens Produções Ltda. e Gullane Filmes com a participação da brasileira Rio Filme Distribuidora e da italiana Fabrica Cinema, e teve grandes nomes no elenco como Rodrigo Santoro, Othon Bastos e Cássia Kiss.

O filme conta a história de Neto, um jovem que é internado em um hospital psiquiátrico, após seu pai descobrir um cigarro de maconha em seu casaco. Lá, Neto é submetido a situações abusivas. O filme além de abordar a questão dos abusos feitos pelos hospitais psiquiátricos, também aborda a questão das drogas e a relação entre pai e filho.

Bicho de Sete Cabeças foi amplamente aclamado de um modo geral, recebendo vários prêmios e indicações, dentre eles, o Prêmio Qualidade Brasil, o Grande Prêmio Cinema Brasil, e o Troféu APCA de "Melhor Filme", além de ser o filme mais premiado do Festival de Brasília e do Festival do Recife. O filme abriu portas para uma nova maneira de pensar sobre as instituições psiquiátricas no Brasil e em torno disso foi aprovada pelo Congresso Nacional, uma lei que proíbe a construção dessas instituições."